Acompanhe-nos no Facebook

terça-feira, 30 de março de 2010

Anfíbios: Uma Pata na Água, outra na Terra

Os anfíbios são animais desconhecidos e geralmente mal-amados. Para contrariar esta visão, propõe-se a exploração, de forma lúdica e interactiva, das características mais espantosas destes animais ameaçados. Nesta exposição, encontrar-se-ão rãs, salamandras, sapos e tritões de Portugal em aquaterrários que recriam os seus habitats naturais, juntamente com imagens de alguns dos melhores fotógrafos de natureza ibéricos, que permitirão observar a sua beleza e impressionante diversidade de cores, formas e comportamentos.

Saiba mais.

quarta-feira, 24 de março de 2010

O que é um animal?

Recentemente fui abordada com a seguinte questão: se a manipulação das condições ambientais de micróbios constituía “experiências que impliquem o sofrimento físico ou psicológico de animais vivos, pela prática de actos de abuso, crueldade ou morte” (regra imposta no Concurso Nacional para Jovens Cientistas e Investigadores).

Fora a ambiguidade do que constitui "abuso, crueldade ou morte", isto levanta a questão que usei como cabeçalho deste post. É verdade que os organismos vivos que não são plantas pertencem ao reino Animal. Mas será que consideramos todos os membros do Reino Animal, animais?

No caso em questão, propús como base o uso da legislação que regulamenta a experimentação animal. Nesta legislação estão incluídos todos os animais vertebrados mas (de momento) nenhum dos invertebrados. Quem pensou a lei (ou melhor, a directiva comunitária subjacente) provavelmente pensou que era entre os vertebrados e os invertebrados que devíamos traçar a fronteira tendo em conta, por um lado, a ‘complexidade sensorial’ dos organismos em questão e, por outro, os aspectos práticos de controlo e fiscalização.

Mas isso não corresponde necessariamente à percepção de senso comum do que é um animal. Penso que a maior parte das pessoas considera um polvo (que provavelmente virá a ser coberto pela futura directiva de experimentação animal) bem como um caracol e uma mosca (que continua a não ser considerada nesta legislação, apesar do papel importante que as moscas-de-fruta têm na investigação) como sendo animais. E que pouca gente considera um micróbio, seja de que género for, um animal.

O que é para si um animal (não-humano)? Onde coloca a fronteira?

sábado, 20 de março de 2010

Animais de Rua + Canil Municipal de Loures



Apesar do folclore televisivo, aqui está um bom exemplo de cooperação entre Canis Municipais e Associações Zoófilas. A Médica Veterinária do Município de Loures procedeu ao arresto de uma centena de cães, após um longo processo legal. A Associação Animais de Rua soube do caso e tomou a iniciativa de encontrar uma solução para a esterilização e adopção desses mesmos animais. A associação zoófila funciona, neste caso, como o veículo intermediário entre o canil municipal, outras associações e a sociedade, em vez de se sobrepor ao trabalho do Médico Veterinário Municipal (MVM). O que muitas vezes acontece é serem as associações a tomar nas suas mãos a missão de apreender animais vadios ou "maltratados" e a encontrar as suas próprias vias de adopção à revelia de qualquer controlo médico-veterinário.
A Associação Animais de Rua é um caso à parte no panorama nacional das associações zoófilas pelo facto de ter uma linha de rumo muito objectiva e definida: capturar, esterilizar e devolver animais errantes. Como não possui instalações próprias esta associação funciona em parceria com outras entidades ou associações, procurando sinergias.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Má sorte nascer com pelos e ter um dono "alérgico"

DN On-line, 16-Março-2010, Ver Vídeo

"Cresceu muito, roeu os sapatos, o filho tem asma, o marido não gostou..." As razões são muitas para se entregar o animal de estimação no Canil/Gatil Municipal de Lisboa. Afastando-me, para já, da discussão sobre a legitimidade moral de algumas destas asserções, gostava de sublinhar dois aspectos, referidos na peça, e que para mim são fundamentais para se compreender a problemática dos animais errantes/abandonados: o primeiro é a imagem do Canil Municipal como sendo o fim da linha, uma espécie de ante-câmara da morte; o segundo é a animosidade latente entre associações zoófilas e canis municipais.

1) O Canil como o fim da linha.
A imagem pública dos Canis Municipais não é a melhor; para a maior parte das pessoas os canis são o último destino daqueles animais que, se não reclamados, serão eutanasiados ao fim de uma semana. É uma imagem que não faz justiça ao trabalho desenvolvido pelos Médicos Veterinários Municipais (MVM), cuja associação ANVETEM eu convido a conhecer. Na verdade, o MVM é o profissional que melhor serviço pode prestar aos animais errantes/abandonados, quer na salvaguadra da sua saúde e bem estar quer em encontrar possibilidades de adopção.

2) A conflitualidade entre Associações Zoófilas e Canis Municipais.
Ao contrário dos anteriores, os canis/gatis das associações zoóficas são por muitos considerados as alternativas mais humanas para os animais errantes. Sem querer generalizar, não é essa a minha experiência. Como referido na peça, as melhores intenções das pessoas envolvidas no activismo pró-animal nem sempre são bem dirigidas e podem culminar em acções que limitam o expectro de acção ao animal que pretendem proteger esquecendo as consequências para os outros animais (como a transmissão de doenças) ou mesmo para a saúde pública. Não nego a importância das associações zoófilas mas defendo que o seu trabalho deve ser articulado em conjunto com o dos serviços oficiais para garantir três dimensões: saúde animal, bem estar animal e saúde pública.

quarta-feira, 10 de março de 2010

A ética de um bom bife - Parte II

Com base nos aspectos ambientais e médicos do consumo de carne, num artigo na revista médica Lancet em 2007, um conjunto de especialistas mundiais recomenda um consumo médio de 90 g de carne por dia, ou seja pouco mais do que metade do actual consumo diário em Portugal. Calcula-se com esta medida obter grandes benefícios de saúde em países industrializados, onde uma redução do consumo de carne implicará uma redução da incidência de doenças cardiovasculares, obesidade e vários tipos de cancro. Permitiria ainda outro benefício médico: a possibilidade de, sem um acréscimo dos problemas ambientais globais, aumentar o consumo de produtos animais nos países em vias de desenvolvimento, onde o presente baixo nível de consumo de proteína constitui um risco para a saúde.

Reduzir o consumo de produtos de origem animal não implica tornar-se vegetariano. Pode implicar comer um pouco menos de carne por refeição, ou incluir algumas refeições vegetarianas na rotina alimentar. Ou porque não dar mais destaque aos pratos tradicionais, criados numa altura em que carne, por razões económicas, tinha que ser um ingrediente minoritário, e a fonte principal de proteínas ser vegetal: uma feijoada, umas tripas-à-moda-do-Porto ou uma sopa de pedra.

Reduzindo assim o consumo de carne, e sendo a carne um alimento caro, o consumidor vai gastar menos dinheiro. Este dinheiro podia ser investido na carne que de facto se vai consumir. Paradoxo? De maneira nenhuma, se consideramos o terceiro aspecto ético do consumo de produtos de origem animal: os próprios animais e o seu bem-estar. Com a pressão económica levando à intensificação da produção, restringe-se a liberdade de movimento e a possibilidade dos animais viverem segundo a sua natureza. Se nós como consumidores podemos pagar um pouco mais pelos menos quilogramas de carne que compramos, podemos antes optar pelos produtos com Denominação de Origem Protegida (DOP), de sistemas de produção locais e de raças autóctones, ou carne da produção biológica. Assim apoiaremos um modo de produção com regras que consideram não só o bem-estar animal mas também a nossa herança cultural e a biodiversidade e paisagem rural onde estes animais pastam.

Mas independentemente da origem da carne, o presente nível de consumo num país industrializado como Portugal não é sustentável. Ou seja, temos um consume de carne que faz mal a nós, aos outros animais e ao planeta. Temos aqui uma discussão que é urgente enfrentar, para que quem tem ética não tenha que passar fome!

A ética de um bom bife - Parte I

Haverá escolha mais quotidiana do que aquela que fazemos quando decidimos o que vamos comer? É uma questão de gosto, tempo, dinheiro – mas não só. Como muitas daquelas escolhas que são feitas por todos nós e todos os dias, as consequências vão bem além do nosso prato. Podem ir desde uma exploração agrícola em Portugal até à floresta tropical no Brasil, envolvendo no percurso questões de saúde pública e de alterações climáticas. Exagero? Pode parecer, mas é o que a ciência nos conta e a ética nos faz reflectir. E numa época tradicional de abstinência, faz sentido questionarmo-nos mais profundamente sobre que valores radicam as nossas escolhas alimentares e quais as suas consequências.

Começando pela questão ambiental - e no aspecto mais falado no momento, as alterações climáticas - a produção animal para consumo humano é um contributo significativo de emissões de gases estufa. Embora um valor controverso, um relatório das Nações Unidas aponta que até 18 % da produção mundial de gases estufa poderá ter origem na produção animal. Devem-se principalmente aos excrementos mas estão também associadas ao uso de matéria-prima oriunda de países tropicais para alimentação de animais. Isto constitui não só um risco para a floresta tropical, ao ser convertida em campos de soja, mas também implica o transporte por longas distâncias de enormes volumes entre os países onde se cultiva a matéria-prima da ração e aqueles onde se criam os animais. A produção animal tem outros efeitos ambientais mais próximos e mais visíveis em tempo real e ao olho nu: a gestão de efluentes com potencial de contaminar águas. Ambas as questões se devem ao facto de os animais serem conversores pouco eficientes de matéria-prima de alimentos em produtos para consumo humano. Um animal precisa de nutrientes não só para produzir a carne que consumimos mas também para alimentar o resto do corpo, e usa energia não só para crescer mas também para se movimentar e manter a temperatura. Tem que comer muito – e beber: para produzir um quilograma de carne, um bovino ingere em média 15000 litros de água. Em grande parte esta água é eliminada como urina e fezes, transportando consigo os nutrientes que não são aproveitados pelo animal. São estes nutrientes que, quando não correctamente tratados e integrados no ecossistema agrícola, podem dar origem às contaminações de água que conhecemos em áreas onde a concentração de pecuária é grande e o tratamento de efluentes precário.

Isto dito, não é o ser humano omnívoro sem razão nutricional. Carne, leite e ovos constituem para nós uma boa fonte de nutrientes importantes, sobretudo proteínas e minerais. É possível alimentar-se bem sem carne, mas é mais difícil. Por outro lado, uma alimentação equilibrada não implica comer tanta carne como comemos. O português consome em média 3 vezes mais proteínas de origem animal do que precisa, e com isto ingere 3 vezes mais gordura que o recomendado pelos nutricionistas. Enquanto a proteína em excesso é um desperdício, a gordura animal em excesso é um risco para a saúde. Está associada ao aumento de risco de desenvolver doenças cardiovasculares, a principal causa de morte em Portugal tal como no resto dos países industrializados.

Ver também A ética de um bom bife -Parte II.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Darwin e a experimentação em animais – Parte I

A propósito de um belíssimo artigo de David Allan Feller (2009), pretendo explorar as visões de Darwin - um defensor dos animais - sobre a vivissecção, uma vez que já tenho visto o seu nome invocado quer pelo lado do pró, quer pelo lado do contra.

Antes de abordar o pensamento de Darwin sobre a questão da experimentação em animais, convém reflectir sobre o impacto da sua obra científica na acesa discussão que desde o séc. XIX tem dividido o público (científico e não-científico), ainda hoje entrincheirado em posições antagónicas, com prejuízo do debate franco em torno de interesses comuns.

Ironicamente, a revolução que constitui a inclusão dos seres humanos num ramo da grande e antiga “árvore da vida”, como apenas um animal parente em maior ou menor grau de todos os outros, tem sido frequentemente invocada como argumento por ambas as facções desta “batalha”. Se por um lado, é na relação de parentesco entre as espécies que se encontra a justificação maior do uso de animais não-humanos para modelar, por “proxy”, a nossa, não é menos verdadeiro que essa mesma proximidade torne improvável que apenas nós tenhamos o exclusivo de sentimentos como auto-consciência, desejo de auto-preservação, dor, ansiedade e medo, mas também faculdades mentais superiores como inteligência, lealdade ou afecto. Mais, se apenas somos “mais uma espécie entre milhares”, que direito temos de interferir de lhes infligir mal-estar, privar da liberdade e até decidir sobre a sua morte para proveito próprio? O facto de partilharmos um passado comum e traços característicos não tornará os outros animais beneficiários da nossa consideração moral?

Há ainda a posição - defendida por alguns grupos mais activistas dos direitos dos animais - de que outras espécies, mesmo mamíferos, serão demasiadamente diferentes de nós para que sejam modelos válidos. Ainda que haja diferenças entre as espécies (por definição, aliás), a verdade é que dentro da classe Mammalia partilhamos a generalidade dos órgãos, sistemas e de organização estrutural e funcional, sendo que as diferenças que de facto existem podem também contribuir para o entendimento da etiologia de algumas doenças.

Mas serão estas características similares às nossas? Até que ponto os milhões de anos de evolução divergente que nos separam de outras espécies nos tornam distintos, nomeadamente nas faculdades mentais? Qual o papel da cultura? Como determiná-lo? Se para muitos que possuem (ou, se preferirem “co-habitam com”) um animal de companhia, é auto-evidente que estes terão comportamentos e emoções não muito diferentes das nossas, também poderá ser alegado que haverá nisto uma nítida antropomorfização, resultante da projecção dos próprios sentimentos daqueles que desejam retorno do investimento emocional dado aos seus amigos quadrúpedes.

Darwin deu um contributo para esta questão na sua obra “The Expression of Emotions in Man and Animals”, posterior a “Origin of Species” e onde estabelecia o claro paralelismo entre as expressões das emoções dos seres humanos e dos outros animais . Mas se as expressões de emoções primárias parecem ser comuns a muitas espécies do reino animal, isso quererá dizer que serão, na natureza e expressão, iguais às nossas ou de outras espécies? E se tal for verdade para algumas emoções, isso será verdadeiro para todas? O amor, a compaixão, a empatia, a cumplicidade, a felicidade, a depressão serão exclusivamente determinados pela expressão dos nossos genes e assim tão mais próximos aos de outros animais quanto mais semelhantes forem os nossos genótipos?

Será a “lealdade” de um cão ao seu dono um sentimento consciente, resultante da confiança gerada ao longo de uma convivência comum e/ou uma contrapartida em agradecimento pela ajuda do dono à sua subsistência? Ou antes um comportamento seleccionado ao longo de centenas de gerações e prontamente reproduzido pelo animal à mínima oportunidade, e sem qualquer outra justificação (muitos conhecerão casos de cães que seguem obedientemente e defendem donos que constantemente os maltratam)? Será outra coisa qualquer, algures no meio (ou à parte destas considerações)? Em suma, podemos tirar as aspas à “lealdade” canina?

Mais ainda, será mesmo importante que estes sentimentos sejam experienciados da mesmíssima forma, ou bastará que sejam similares, ainda que remotamente, para que os devamos considerar como tais?

Um caso mais ou menos recente de atribuição de sentimentos tidos como tipicamente humanos a outros animais foi o artigo do Dr. Jaak Panksepp, no qual reportava que ratinhos “riam” (com guinchos ultra-sónicos) quando “brincavam” ou lhes eram feitas “cócegas” no ventre.

Sem ser tão céptico que rejeite a priori esta possibilidade, sou da opinião de que o salto teórico (e paradigmático) que exige a atribuição de alguns sentimentos humanos a outros animais não se deverá basear num conjunto limitado de dados, principalmente numa espécie separada de nós em cerca de 65 milhões de anos. Até se definir definitivamente a homologia entre estas vocalizações e o riso humano, a maior parte da comunidade de psicólogos experimentais continuará a ver esta associação como precipitado antropomorfismo (aconselho Blumberg e Sokoloff, 2003).

Mais investigação na área, precisa-se, começando pelas espécies que nos são mais próximas filogeneticamente, e partindo daí "para baixo". Mas seria ainda necessário que começássemos por definir o que é a empatia, a compaixão, o riso ou a lealdade humanas, entre outras emoções.


Se calhar já divergi um pouco do assunto em epígrafe, mas espero que no próximo me consiga centrar mais na questão, e nomeadamente na visão do próprio Darwin sobre a mesma. A propósito, mais uma questão/provocação: a esperança é um sentimento que partilhamos com outros animais? (continua)