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sexta-feira, 22 de julho de 2011

Porque é que o cão é gordo? Olhe para o proprietário!

A epidemia de obesidade alastrou seriamente para os nossos amigos de quatro patas. Estudos levados a cabo nos EUA, Austrália e em vários países europeus mostram os mesmos resultados: este é um sério e crescente problema para cães e gatos.

No início de 2010 passei alguns dias com um dos principais investigadores em obesidade animal, Dr Alex German da Escola Veterinária de Liverpool. Eramos ambos peritos convidados por parte de um projecto em que investigadores do Royal Veterinary College, de Londres, procuravam identificar problemas de bem-estar em animais de estimação. Eu tinha, portanto, uma óptima oportunidade para ouvir falar no problema e saber o que a comunidade veterinária tenta fazer sobre ele.

É díficil quantificar exactamente a extensão da obesidade em cães e gatos. Com os seus diferentes tamanhos e formas, não é possível encaixar os animais numa única fórmula de obesidade. No entanto, os investigadores têm concebido métodos para medir a gordura animal. Segundo Alex German, cerca de 40% dos cães no Reino Unido têm excesso de peso e cerca de um em cada dez está com sobrepeso num grau que representa uma séria ameaça à sua saúde.

É um problema para os animais. Felizmente ser gordo não parece influenciar a sua auto-estima. Mas influencía a sua saúde. Cães e gatos obesos são afectados por doenças do estilo de vida, tais como diabetes e doenças cardiovasculares com a consequência de que morrem muito mais cedo do que o esperado. E antes de chegar tão longe, a obesidade afecta a saúde e qualidade de vida. Alex German acredita que os cães com sobrepeso e obesos levam vidas menos activas do que os seus semelhantes delgados.

É, obviamente, também um problema para seus donos que os animais sejam inativos e venham, eventualmente, a adoecer e a morrer prematuramente. Neste contexto, pode-se perguntar por que é que as pessoas não se limitam a dar ao seu cão ou gato um pouco menos de comer. É compreensível que possamos lutar para controlar a nossa própria alimentação quando temos de resistir às muitas tentações calóricas que enfrentamos diariamente. Mas os cães e gatos não comem nada, a não ser o que lhes servimos!

O problema com esse argumento de senso comum é que ele ignora completamente o tipo de relacionamento que muitas pessoas têm com os seus animais. Enquanto no passado os animais eram mantidos para ser usados num qualquer propósito, a manutenção de cães e gatos tornou-se numa espécie de simbiose entre animal e dono. O termo de animal de companhia acresce ao termo animal de estimação o facto de cães e gatos funcionarem como membros da família.

Investigadores falam de "ligação" entre humanos e animais - isto é, laços estreitos entre o cão ou gato da família e o seu dono. Isto significa que há uma relação de interdependência entre seres humanos e animais. Mesmo se uma parte é legalmente proprietária e a outra propriedade, o relacionamento dá-se ao nível emocional, que é muito mais complexo do que isto. A relação entre proprietário e animal pode, de muitas maneiras, ser comparada à relação entre pai e filho.

Essa semelhança é de certa forma confirmada pela crescente pesquisa em obesidade veterinária. Da mesma forma que se sabe que a obesidade em crianças está muitas vezes relacionada com a obesidade dos pais, verifica-se também que há mais cães obesos entre pessoas obesas do que entre magras. E assim como está bem documentado que os pais de crianças com sobrepeso muitas vezes não reconhecem esse excesso de peso, estudos recentemente publicados mostram que os proprietários de cães e gatos obesos, muitas vezes não conseguem ver que os seus animais são muito gordos.

Assim como as refeições são um campo onde crianças e os pais combatem uma grande parte das lutas de poder familiar, a alimentação e a distribuição de doces é um eixo importante na interacção entre animal e dono. Este último usa frequentemente o animal para prestar cuidados e para receber o que é percepcionado como um sinal de afectuoso reconhecimento. Inconscientemente, o proprietário pode vir a treinar o animal para pedir comida e mostrar sinais de alegria quando é alimentado. Imediatamente há uma situação de duplo ganho em que o proprietário é reconfortado e o animal recebe algo de comer.

Estas percepções são importantes se se quiser tentar aliviar o problema da obesidade em cães e gatos. Na Faculdade de Medicina Veterinária de Liverpool abriu a primeira cliníca de obesidade para cães e gatos na Europa, liderada por Alex German. Pretende-se atacar o problema da obesidade pela raíz, nomadamente na interacção entre dono e animal.Veja www.pet-slimmers.com.

Quando dono e animal aparecem juntamente na clínica, o animal é submetido a um exame clínico completo, e faz-se uma medição precisa da quantidade de gordura existente no seu corpo recorrendo a um scanner especial. O dono pode, assim, quantificar o quão gordo o seu cão ou gato é. Esta quantificação é importante para impelir o proprietário a enfrentar o problema. Como mencionado acima, os proprietários de cães e gatos obesos, muitas vezes não percebem que os seus animais têm pretuberâncias nos lugares errados.

Na primeira consulta é feito um plano do que o animal pode comer e como deve ser exercitado. Mas este não é o fim do tratamento. O proprietário retorna periodicamente à clínica de obesidade para pesar o seu animal. Esta é a mesma estratégia usada em pessoas obesas que estão a perder peso. Mesmo com a maior força de vontade isso não é possível sozinho: é preciso alguém em que se apoiar.

Se o proprietário não voltasse à clínica para ser responsabilizado, ele iria sucumbir aos olhos suplicantes do cão e às persistentes tentativas do gato em saciar-se. Ao mesmo tempo, por causa da íntima ligação com o cão ou gato, o proprietário muitas vezes não é capaz de corrigir a alimentação do animal, sem ter de lidar com seus próprios hábitos alimentares - o que sabemos ser difícil.

Um cão ou gato obeso será normalmente sujeito a uma dieta especial. A venda de alimentos dietéticos é já um grande negócio para as empresas de alimentação e para veterinários. Neste contexto não é de surpreender que a clínica de emagrecimento em Liverpool, a "Royal Canin Weight Management Clinic", seja patrocinada por uma das principais empresas de alimentação animal.

Pode-se pensar ser oportunismo ganhar dinheiro com a venda de dietas especiais para cães e gatos quando o problema poderia ser resolvido se as pessoas apenas dessem aos seus animais um pouco menos da alimentação regular. Mas isso seria, em certo sentido, negligenciar o ponto crucial: não é o cão ou gato, mas o proprietário quem está a fazer dieta. E ter que reduzir a quantidade de alimento que se dá ao muito amado cão ou gato é deveras difícil. Então é melhor servir uma dieta cara com teor calórico reduzido em porções de tamanho usual.

Você não quer diminuir o amor que nutre pelo seu melhor amigo.

Peter Sandoe

terça-feira, 19 de julho de 2011

Zebradas

Na visão moderna de biologia não há lugar para instintos - qualquer comportamento é visto como o resultado de factores geneticos e ambientais em combinação com a experiência própria de um indivíduo. 

Uma belissima ilustração disto é a foto abaixo que mostra o primeiro contacto que uma égua primípara tem com a sua cria rescem-nascida. Para esta situação em que não há experiência e em que há pouco espaço para tentativas e erros, sob a influência hormonal a égua responde ao novo ser e estabelece o contacto necessário com ele. Pouco tempo depois a poldra levantara-se para mamar e passado uma hora estará pronta para acompanhar a mãe.

A egua Henja Kry com a sua rescem-nascida primogenita Grånosa Kry. Foto Helena Kättström.

Em todas as raças de cavalo os poldros têm esta capacidade precoce de se movimentar com destreza e rapidez de um adulto. Faz parte do pacote de sobrevivência destes animais - é a sua natureza. Mas são poucos os cavalos em que podemos ver traços físicos tão fortes da sua origem como nestes da raça cavalo-de-fjord-norueguês.
Foto: Helena Kättström
As zebradas (as riscas por cima do joelho dianteiro), a lista de mulo (a risca escura na crina, dorso e cauda) e a cor parda são caracteristicas partilhadas com os cavalos portuguêses de raça sorraia e os przewalski. Quanto aos zebras propriamente ditos, pertencem à mesma família, os equídeos, mas constituem um ramo diferente.




domingo, 10 de julho de 2011

Quando caçar é um jogo de crianças

Muito se tem falado na sociedade e nos meios de comunicação sobre a violência nos videojogos como um factor que pode dessensibilizar ou mesmo incitar nos jogadores - e principalmente nos mais novos - para a violência no mundo real. Há inclusive variadíssimos estudos a este respeito. Mas que pensar no caso de actividades hoje tidas como perfeitamente lícitas e aceitáveis por uma grande parte da população, como é o caso da caça?

Um dos muitos jogos que permitem caçar veados virtuais
Encontrei numa grande loja de electrodomésticos e outros equipamentos electrónicos no Porto um jogo para consola que pretende mimetizar com elevado grau de fidelidade à realidade a caça de animais de grande porte, com réplica de arma de caça incluída. Uma rápida pesquisa no Google revelou que, só para uma das consolas mais populares, existem dezenas destes jogos, podendo os consumidores escolher entre uma grande variedade de armas e animais para caçar. Evidentemente, todas as outras plataformas têm também à disponibilidade dos gamers jogos do mesmo tipo.
 
Poder-se-á argumentar que a maior parte dos jogadores que matam zombies, terroristas, soldados, polícias ou outros quaisquer inimigos virtuais não tem a mínima intenção de reproduzir esse comportamento no mundo real. Ademais, pode-se mesmo advogar que estes jogos podem constituir uma substituição efectiva da caça, uma prática generalizada e com muitos adeptos e que tem efeitos negativos no bem-estar animal e na conservação das espécies. Afinal, abater animais virtuais não tem qualquer efeito directo na vida e no bem-estar de um só animal real. 

Mas há a possibilidade deste tipo de jogos contribuir para popularizar ainda mais a prática da caça, principalmente nos mais jovens. Não se pode também descartar que este jogos possam dessensibilizar os jogadores para o sofrimento dos animais caçados (que não se resume de maneira alguma ao momento do abate, como ilustra um conhecido estudo de P. Bateson e E. Bradshaw) e/ou que leve os jogadores a entenderem a prática da caça real como um jogo, em que a pontuação depende do número de animais abatidos.

"Snapshots" ilustrativas das imagens que surgem no ecrã  durante um jogo
Colocam-se assim, no plano ético, várias questões, as quais beneficiariam de estudos especialmente dirigidos a este novo segmento de videojogos e jogadores. Digno de registo é o facto de alguns controladores desenhados para serem usados nestes jogos mimetizarem na perfeição armas reais, algo que foi já proposto como amplificador do efeito negativo dos jogos violentos no comportamento violento.

Um exemplo de um comando que reproduz fielmente uma arma e caça  
Numa secção de um site dedicada a pais e educadores, pode-se ler que Hunting games for kids safely introduces your kids to the world of hunting. In fact, online hunting games and similar software may totally satisfy your kids' need to become a hunter. Vá-se lá saber porquê, nunca imaginei que as crianças tivessem necessidades dessas...

Sem comentários...

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Trabalhar com Bem-Estar Animal em Portugal: George Stilwell, FMV





George Stilwell, professor auxiliar Faculdade de Medicina Veterinäria

Olá George, tens um novo projecto de investigação em curso. Podes nós contar um pouco mais sobre
Animal Welfare Indicators?

O Animal Welfare Indicators (AWIN) é um grande projecto europeu que vem na sequência de um outro chamado Welfare Quality. O AWIN irá estudar os indicadores de bem-estar nas espécies que não foram abordadas pelo projecto anterior, ou seja, os ovinos, caprinos, equídeos (cavalos e burros) e ainda perus. Será ainda um dos principais objectivos do AWIN criar uma plataforma online de ensino e divulgação de temas de bem-estar animal.
O AWIN é coordenado pelo Scottish Agriculture College, e envolve 11 parceiros em 10 países (9 na Europa e Brasil).
Em Portugal a instituição envolvida é a Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Técnica de Lisboa. Durante os próximos 4 anos irei orientar as actividades de dois estudantes de doutoramento, para além de uma estudante de doutoramento em parceria com a Universidade de Milão.
A área de estudo em Portugal será a de bem-estar de pequenos ruminantes e principalmente de cabras leiteiras em regime intensivo.

Que resultados esperam deste projecto?

Os estudos a serem conduzidos em Portugal irão dividir-se em duas áreas principais: a) criação de um modelo de certificação de bem-estar nas explorações de pequenos ruminantes através de indicadores validados; b) avaliar o impacto de certas doenças sobre o bem-estar, nomeadamente através da dor.
No primeiro grupo de estudos pretendemos identificar os sinais que permitirão a produtores, investigadores e avaliadores reconhecer, de forma rápida e prática, problemas de bem-estar a nível das explorações. A validade, repetibilidade e exequibilidade destes indicadores de bem-estar serão testadas em diversas explorações com sistemas de produção e raças diferentes. De seguida o modelo será testado a nível dos outros países europeus. Com este estudo será possível criar as ferramentas necessárias para distinguir as explorações onde o bem-estar animal está garantido, podendo assim comunicar ao consumidor que um determinado produto respeita as normas mais exigentes de respeito pelos animais.
O segundo grupo de trabalho estudará a dor em doenças e práticas de rotina como a peeira, laminite, mastites, artrites, descorna etc… Pretende-se com estes estudos perceber se a dor é uma vertente importante na patogenese das doenças e se a analgesia deverá ser considerada como parte essencial do tratamento facilitando a recuperação do animal.

Penso que é a primeira vez que uma universidade portuguesa participa num projecto europeu desta dimensão sobre bem-estar animal na pecuária. É importante haver esta participação de investigadores nacionais em projectos internacionais?
Também julgo que se trata da primeira colaboração desta dimensão na área do bem-estar animal. Com esta parceria Portugal deverá demonstrar à comunidade internacional duas coisas: que o estudo e a preocupação com o bem-estar animal não é um exclusivo dos países do norte da Europa, que geralmente lideram nestas áreas; e que existe em Portugal conhecimentos, experiência e vontade suficiente para investigar em temas complexos como o da área do bem-estar em explorações de pecuária.
Olhando a questão pelo outro lado, podemos dizer que estes projectos vêm mostrar aos produtores, empresas do sector da pecuária e políticos de Portugal, que esta é uma área com eles se devem preocupar e que podem contar com os cientistas das instituições nacionais para responder às suas questões e apresentar soluções que protejam o bem-estar animal sem inviabilizar actividade pecuária. Aquela ideia de que as regras de bem-estar são criadas para que os países do norte acabem com a produção dos países do sul, tem de ser combatida com urgência.

George, já trabalhas com bem-estar animal há muito tempo na Faculdade de Medicina Veterinária em Lisboa e também em colaborações internacionais de diferentes tipos. Como estão os animais em Portugal – bem ou mal? Melhor ou pior do que há 15 anos?
Vou falar essencialmente do bem-estar de animais de pecuária já que são aqueles com os quais trabalho diariamente. Não tenho a menor dúvida de que o bem-estar destes animais está melhor do que há 15 anos. Isto não quer dizer que esteja perfeito ou mesmo bom para todos eles. Muito ainda há a fazer!
Quando consideramos o bem-estar de animais de produção temos de perceber que nunca será possível garantir que os animais viverão sem ameaças ao seu bem-estar. Pensemos em ovelhas em pastagem – aparentemente uma situação óptima em termos de bem-estar – e nas importantes ameaças que surgem com o clima, intempéries, parasitas e doenças, que serão sempre mais graves do que em sistemas intensivos.

Dito isto, acho que podemos afirmar que avançámos muito em termos de bem-estar por via de regras impostas pela legislação (infelizmente quase sempre imposta pela UE e raramente por nossa iniciativa), mas também porque os próprios produtores perceberam que as performances dos animais são muito superiores quando o conforto e bem-estar dos seus animais estão garantidos. Outro factor importante e relativamente recente é a pressão dos consumidores que, pelas razões certas ou erradas, associaram a segurança e qualidade dos produtos a certos sistemas e práticas que são mais amigas dos animais. Também a evolução económica e financeira permitiu que o consumidor passasse a integrar outros requisitos nas suas exigências, sendo a ética uma das que mais influenciou a forma como passamos a lidar com os animais. Ou seja, a produção teve de alterar certas práticas ou arriscar-se a não conseguir escoar os seus produtos. Características do abate, do transporte, da alimentação, das instalações e do maneio são hoje em dia (também) baseadas nos seus efeitos sobre o bem-estar dos animais.

Bem-estar animal não é apenas ciência, tem também uma clara conotação política. Temos uma nova ministra de Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento. Que assuntos consideras mais urgentes para esta nova responsável máxima pelo bem-estar animal em Portugal?

Como já referi o bem-estar animal não é apenas uma preocupação para os animais, produtores e certas pequenos grupos, mas é um assunto que desassossega cada vez mais a sociedade em geral e os consumidores em particular. Sendo assim é uma obrigação de qualquer governante dar resposta a estas inquietações. O maior desafio que se põe neste momento de crise (afectando consumidores e produtores) é não deixar subjugar as preocupações com o bem-estar animal pelas questões económicas. Esta será uma tentação para quem tiver uma visão muito limitada já que a médio prazo as perdas previsíveis em qualidade, quantidade e segurança dos produtos de origem animal conduzirão a menores consumos ou procura de alternativas. Será preferível ajudar as explorações a superar estes momentos difíceis exigindo em troca a manutenção (aumento) das acções em prole do bem-estar, ambiente e sustentabilidade da produção.

As maiores prioridades serão de aplicar as regras e recomendações de bem-estar que a UE propõe – e.g. eliminação das celas para porcas e introdução de gaiolas melhoradas para galinhas poedeiras. Igualmente importante será a formação de produtores, tratadores e transportadores de animais na área do comportamento e bem-estar animal. É óbvio que a simples transcrição das directivas sem a fiscalização subsequente é como chover no molhado. É aqui que o Ministério deve apostar nos próximos tempos.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Bem-estar animal no abate

Mas que raio de conceito é esse - criar e abater os animais em massa, pretender que se preocupa com o bem-estar deles e ainda ter a lata de declarar que até podemos ganhar mais dinheiro com isso. Tenho toda a compreensão pelo leitor que reage assim - foi consigo em mente que escrevi o post anterior, porque acho que é preciso ver o contexto em que se encontra a ciência de bem-estar animal para perceber o que se investiga.

Criação de porcos para abate é na Dinamarca uma actividade economica com peso considerável no produto nacional bruto. Enquanto o país tem pouco mais do que 5 milhões de habitantes, produz (e exporta) carne de porco suficiente para alimentar 15 milhões. Que há preocupação com a eficiencia neste sector não é de surprender. Mas o público dinamarquês preocupa-se também com o bem-estar animal.

Até que ponto consegue esta preocupação competir com a preocupação economica? Bem, esta pergunta não tem uma resposta, depende da situação.


Existem circunstâncias em que ambos ganham. As imagens deste post vem de um poster apresentado no UFAW International Symposium Making animal welfare improvements: Economic and other incentives and constraints. Apresenta numeros capazes de convencer mesmo quem se preocupa mais com centimos do que com porcos que um sistema de abate que causa menor stress aos animais não é um custo. 



A mudança que se introduziu foi de manter os mesmos grupos de animais desde a saida da exploração (quinta) até o abate. Os animais passam por todos os passos incluindo o atordoamento sempre junto com o mesmo grupo de individuos, nunca estão sozinhos e não são misturados com animais que não conhecem. A qualidade da carne melhora, a quantidade de carcaça que tem que ser removida por ter lesões diminui e (como é mais facil manobrar porcos que estão menos stressados) é preciso menos mão de obra para lidar com o mesmo número de animais.

Não sei qual foi o motivo de introduzir estas mudanças. Mas é um bom exemplo como é possível colaborar com o comportamento natural dos animais e fazer melhor para todos. 



O que é bem-estar animal?

Ao regressar de um congresso em que estive a ouvir os últimos resultados de investigação neste campo (e recolhendo material para o blog), ocorreu-me que nunca realmente esclarecemos esse tópico no animalogos. Na série de entrevistas que acabamos de iniciar perguntamos às pessoas sobre o estado de bem-estar animal em Portugal, e bem-estar animal e ética animal aparecem junto com os animais na sociedade como os tópicos predominantes abordados aqui – são claramente questões fundamentais para o blog.

A minha motivação para iniciar este blog foi o de estabelecer um lugar onde se poderia discutir questões que têm a ver com a forma como nós, seres humanos, convivem com os animais não-humanos, especialmente daqueles perante os quais temos uma responsabilidade direta por controlarmos a suas vidas. Era também importante que essa discussão fosse baseada em factos relevantes. Há espaço para opinião aqui, mas esta opinião deve resultar de conhecimento dos factos e a reflexão sobre suas consequências.

Em grande medida, é o mesmo raciocínio que está por trás do desenvolvimento da ciência do bem-estar animal. Costumamos traçar a sua história para trás quase 50 anos, à publicação em 1964 do livro Animal Machines, escrito pela jornalista britânica Ruth Harrison.



O livro é uma peça de jornalismo investigativo sobre aquela produção intensiva, que estava prestes a se tornar o tipo de pecuária predominante nos países industrializados da época. As palavras de abertura do livro reflete o que Ruth Harrison pensava desta forma de manter os animais.
“I am going to discuss a new type of farming, of production line methods applied to the rearing of animals, of animals living out their lives in darkness and immobility without a sight of the sun, of a generation of men who see in the animal they rear only its conversion factor in to human food”
Em resposta à preocupação publica que o livro causou, o governo britânico formou um comité científico para analisar a questão do bem-estar animal, a comissão de Brambell em 1965. Este foi a primeira abordagem sistemática usando conhecimento científico para compreender o bem-estar animal. Se houver um momento na história em que a ciência do bem-estar animal foi realmente estabelecida, é neste.

Desde então um número crescente de cientistas num número crescente de países utiliza métodos de pesquisa científica para entender como os animais estão em diferentes situações. Com formação diversificada e usando uma variedade de métodos, os cientistas partilham terreno comum para o seu trabalho, um terreno que consta nos seguintes pressupostos
  • Os animals têm um bem-estar que lhes importa, e o bem-estar desses animais é uma questão importante para a sociedade
  • Como seres humanos que utilizam outros animais somos obrigados a fazer um esforço para melhorar o bem-estar animal (mas não necessariamente obrigados a deixar de usar animais)
  • A investigação científica é necessária para melhorar a nossa compreensão de como medir e melhorar o bem-estar animal
Tradicionalmente a investigação científica baseava-se em fisiologia de stress, etologia e medicina veterinária. Agora olha-se cada vez mais para as ciências sociais e economia - o que vemos claramente na escolha do tema do congresso: Making animal welfare improvements: Economic and other incentives and constraints.