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terça-feira, 3 de maio de 2011

Crueldade Animal... outra vez ?

Vídeos realizados com câmaras ocultas a denunciar crueldade contra animais em países desenvolvidos não são, infelizmente, novidade. Mas o presente vídeo - filmado pela organização Mercy for Animals e divulgado por uma estação de televisão regional norte-americana - tem o condão de nos chocar e por isso alerto para a grafismo excessivo das imagens.



Trouxe este vídeo ao ANIMALOGOS não por ter um prazer especial em propagar pela blogosfera imagens de crueldade contra animais, mas sim para dar conta da resposta pronta e consentânea da AVMA (American Veterinary Medical Association), que também pode ser vista no seguinte vídeo.



Esta declaração tem, a meu ver, duas virtudes principais:

Primeiro, não perde tempo a condenar o modo como as imagens foram feitas nem procura desculpabilizar o que é visto: "Too often, those in the industry seem more concerned about attacking those responsible for producing the videos than addressing the abuse depicted in them, and that attitude has got to change. Attempting to shift the blame is a denial of the real issue."

Segundo, porque após reconhecer o problema, a AVMA parte para um exercício de auto-reflexão assumindo as suas responsabilidades e deixando propostas de como o abordar, nomeadamente no que diz respeito ao papel dos médicos veterinários.

Pouco se fala de virtudes quando se fala em ética animal. Frequentemente, a compaixão parece ser vista como a melhor das virtudes (e muitas vezes a única necessária) por ser aquela que nos permite amar os animais e compreender o seus estados emocionais. Mas como nos mostra a AVMA, outras virtudes são importantes para se poder discutir estas matérias: humildade, cooperação, responsabilidade, equanimidade e determinação. O exercício de virtudes permite-nos constituir pontes com aqueles que têm visões diferentes - e por vezes opostas - das nossas. E são essas pontes que nos permitem, num mundo plural e complexo, gerar consensos sobre o modo como os animais devem ser tratados.

4 comentários:

  1. Penso que é muito interessante discutir isto da perspectiva das virtudes. A primeira pergunta que me vem a cabeça ao observar estes videos é: Que tipo de pessoa faço de mim se sistematicamente cometo actos como estas?

    Durante o primeiro ano da minha formação em ciência animal, aprendi a fazer todos os procedimentos que se faz de forma rotineira na produção animal moderna. Aceitei isto como competências necessárias a adquirir. Mais tarde comecei a fazer outro tipo de interrogação e passei os ultimos dois anos da faculdade a por em causa quase tudo. (Devo ter sido uma aluna insuportável...)

    Como doutoranda, ajudei uma vez uma colega num fim-de-semana na vacaria onde fazia o seu projecto. Uma vaca tinha parido no mesmo dia, e eu observei o tratador de serviço a colocar o bezerro no box dele, e a pensar certamente algo sobre a falta da empatia de quem faz isto todos os dias. Mas o próprio tratador interrompeu os meus pensamentos e disse "Detesto ter que fazer isto".

    É portanto possível não se deixar desvirtualizar. No entanto, obrigado pelo sistema, continuava a cometer o acto.

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  2. Continuando esta reflexão, o que faz uma pessoa virtuosa num sistema em que actos desrespeitosos são prática comum?

    Mark Bittman escreve numa crónica em NY Times http://opinionator.blogs.nytimes.com/2011/04/26/who-protects-the-animals/
    "The biggest problem of all is that we’ve created a system in which standard factory-farming practices are inhumane"

    Isto não é um problema para a ética das virtudes, evidentemente. É um problema para os animais, e um problema para nós, a humanidade.

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  3. Eu reformulava a tua pergunta da seguinte forma: será que um raciocínio virtuoso só o é se for acompanhado de um comportamento igualmente virtuoso? O tratador que coloca o vitelo em isolamento na box previlegia o cumprimento do seu dever em detrimento do exercício de virtudes pessoais. Mas isso não faz dele necessariamente uma pessoa pouco compassiva. A mesma questão se coloca com os alunos de medicina veterinária, um pouco por todo o mundo. Quando se afirma que a educação veterinária inibe o desenvolvimento do raciocínio ético dos alunos não será que estamos a inibir o seu exercício de virtudes pessoais? A meu ver o problema da ética de virtudes é que as virtudes só se podem ensinar pelo exemplo e esse exemplo eles não encontram nos sistemas intensivos de produção animal.

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  4. No caso que a Anna relata, não me parece haver aqui um déficit de comportamento virtuoso, mas antes o exercício de uma virtude (ou várias, como o profissionalismo, obediência, sentido de dever, providenciar sustento para a família,etc.)em detrimento de outra (a compaixão pelo animal). Agora, é certo que muitos poderão nem sequer fazer esse exercício de ponderação, e podemo-nos interrogar porque razão há pessoas cujo comportamento poderíamos considerar como "cruel", sem justificação aparente para tal. Simon Baron-Cohen tem uma teoria bastante interessante acerca deste tema, rejeitando ao mesmo tempo o uso de terminologias associadas à interpretação religiosa, que recorrem a conceitos um tanto ou quanto esotéricos como sendo "O Mal". Segundo Baron-Cohen, pessoas que cometem actos que outros considerariam como "evil", tem um subdesenvolvimento, por razões genéticas e/ou ambientais (como a educação) de competências como a empatia (que divide em 6 graus, ainda que admita haver um contínuo). Assim, as atrocidades do III Reich, por exemplo, deveram-se a uma total falta de empatia colectiva por pessoas pertencentes a uma etnia diferente. Baron-Cohen afirma ainda que, não obstante haver pessoas predeterminadas para baixos níveis de empatia, essa capacidade ("skill") pode ser desenvolvida, ainda que com algumas limitações. Aplicando esta perspectiva à ética animal, não podemos nós estar perante pessoas cujo grau de empatia para com os animais é muito baixo, por razões que fogem ao seu controlo imediato (como genéticas, do desenvolvimento ou da sua educação)? E, assim sendo, podem estas pessoas ser reabilitadas?

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