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sexta-feira, 1 de março de 2013

Genetica molecular e bem-estar animal - entrevista com Per Jensen

Olá Per Jensen, professor de Etologia e coordenador do grupo de investigação AVIAN na Universidade de Linköping, na Suécia. Parabéns pela atribuição do European Research Council Advanced Grant para o projecto Genetics and Epigenetics of Animal Welfare (GENEWELL)! Podias por favor explicar aos nossos leitores um pouco mais sobre este projecto? 

O plano é estender a nossa actual linha de investigação em genética e epigenética do comportamento em galinhas, mas também abrir uma nova linha de investigação deste tipo em cães. Estou particularmente interessado em aprofundar o conhecimento em bem-estar animal, nomeadamente como é que os animais são afectados por experiências stressantes, como lidam com estes desafios e como a habilidade para o fazer é afectada por factores genéticos e epigenéticos. Tradicionalmente, tem-se focado a pesquisa em bem-estar nas interacções entre animais e o seu ambiente, como por exemplo no que diz respeito às necessidades comportamentais de cada espécie. Estou interessado em perceber como isto é afectado pelos genes do animal, e também como é afectado pela intensa selecção de que os animais são alvo face às condições de produção modernas. Investimos vários anos no mapeamento de genes relacionados com o comportamento, stress e bem-estar em galinhas e queremos agora fazer estudos semelhantes em cães. O melhor amigo do homem tem sido criado para manifestar diferentes comportamentos há centenas de anos, e isto abre uma oportunidade de ouro para encontrar genes relacionados com as diferenças entre as raças. Por exemplo, que mecanismos genéticos fazem com que algumas raças sejam capazes de lidar melhor com situações stressantes, ou para colaborar com humanos? Esta é uma abordagem relativamente nova na investigação do bem-estar animal, e penso que dará uma contribuição fundamental para o nosso entendimento da biologia animal, no seu todo. 

A genética molecular tem sido vista como uma revolução, num certo sentido, em muitas áreas de investigação em ciências da vida. Em muita da investigação biomédica, por exemplo, tem permitido aos cientistas identificar mutações determinantes para certas doenças, bem como criar modelos melhorados destas doenças. Estas ferramentas demoraram mais a entrar na ciência de bem-estar animal. Que importantes descobertas podemos esperar do uso da genética molecular nesta área?

A visão tradicional em Biologia tem sido que os animais nascem com um determinado conjunto de genes estáveis que só se alteram gradualmente e ao longo de muitas gerações pela acção da selecção de mutações aleatórias. No entanto, tem sido cada vez mais evidente que o modo como os genes são expressos e interagem pode mudar ao longo da vida. Ao conjunto de mecanismos que regulam este fenómeno – mudando o modo como os genes funcionam sem contudo alterar a sequência de DNA –chamamos “epigenética”. Penso que podemos ter subestimado até que ponto esta orquestração do genoma é afectada por situações stressantes ao longo da vida, e como isto por sua vez altera a habilidade de um animal de se adaptar a vários desafios. Têm sido demonstrados inclusive efeitos epigenéticos transgeracionais, de modo que o stress numa geração pode afectar descendentes que ainda não nasceram ou eclodiram
 
Espero vir a compreender como mutações, por exemplo aquelas acumuladas durante a domesticação, afectam o sistema de controlo do stress e como os mecanismos epigenéticos podem calibrar e modificar todo este sistema. A relação entre os genes e as interacções ambientais são bem conhecidas em ciência: o modo como um gene em particular afecta o fenótipo depende do ambiente em que o animal vive. Agora queremos acrescentar ao epigenoma e estudar interacções entre três factores: alguns genes podem causar variação epigenética, que por sua vez afectam a expressão génica e tudo isto modela o fenótipo, que depende ainda do ambiente. A maior parte deste trabalho será realizado em galinhas mas, usando cães e a imensa variação entre as diversas raças, esperamos poder encontrar genes e mutações que possam explicar variações no modo como os animais se adaptam a diferentes circunstâncias.

Perguntei acima acerca de importantes descobertas futuras. Podemos no entanto já ter algumas descobertas importantes? 

Sim, sem dúvida. Por exemplo, localizámos nas galinhas dois importantes genes, onde mutações têm vindo a ser seleccionadas pelo processo de domesticação. Ao estudar galinhas portadoras dessas mutações e comparando com o seu antecessor (o galo selvagem) continuaremos a tentar entender todos os seus efeitos fenotípicos. O primeiro gene (TSHR) codifica para o receptor da hormona estimulante da tiróide. Este gene está aparentemente envolvido no desenvolvimento e maturação sexual e poderá afectar o comportamento e a resposta ao stress. O outro gene no qual já estamos a trabalhar codifica para o alfa-adrenoreceptor 2c (ADRA2c). Este é um auto-receptor que calibra a resposta ao stress pelo sistema nervoso autónomo e é possível que desempenhe uma função fundamental na regulação do modo como o stress é experienciado pelas aves. Encontrámos grandes diferenças numa das mais importantes variantes epigenéticas (chamada metilação do DNA), entre galos selvagens (Red Junglefowl) e domesticados da variante White Leghorn. Queremos agora descobrir qual a diferença fenotípica entre estas duas aves. Parece claro que a domesticação levou a enormes mudanças na regulação do genoma, mesmo que as diferenças na cadeia de DNA em si sejam pequenas.

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